
A audição é um dos sentidos mais nobres e sua principal função esta ligada à aquisição e ao desenvolvimento da linguagem oral, essencial nas relações interpessoais. Assim é fundamental que qualquer distúrbio nessa função seja detectado e tratado precocemente. Sabe-se que a epidemiologia da deficiência pode variar, de acordo com os fatores geográficos e econômicos e sua prevalência é menor em países cuja população tenha um padrão de vida mais alto e/ou conte com sistema de saúde bem desenvolvido. A deficiência auditiva é um dos problemas sensoriais de maior incidência na população brasileira segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A cada mil crianças nascidas no Brasil, de duas a sete apresentam perdas auditivas congênitas. De acordo com o censo de 2010 nove milhões de brasileiros podem ser considerados surdos por apresentarem perdas auditivas sensorioneurais de grau severo a profundo. De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS) no ano de 2011 existiam 28 milhões de pessoas no Brasil portadoras de algum tipo de comprometimento auditivo. No Nordeste do a incidência problemas auditivos está acima da média nacional, que é de 5,1% da população. Na Bahia essa prevalência é de 5,5%, logo dos 15.044.137 habitantes do Estado aproximadamente 451.324.11 necessitam de atenção especializada em relação à saúde auditiva. Deste quantitativo uma parcela considerável apresenta perdas auditivas incapacitantes sensorioneurais de graus severo a profundo que demandam maior complexidade no tratamento.
O diagnóstico e a intervenção precoces são fundamentais diminuindo o impacto que a surdez tem na vida do indivíduo. Um ponto importante a ser levado em consideração na intervenção precoce na deficiência auditiva é a plasticidade do sistema auditivo central, que é a capacidade de reorganização do mesmo após a reorganização da entrada sensorial degrada por meio de estratégias eficientes de reabilitação auditiva. O implante coclear (IC) é o principal método para reabilitação da função auditiva em pacientes que apresentam uma perda auditiva sensorioneural de grau severo ou profundo bilateral e que apresentam desempenho limitado com o uso de aparelho de amplificação sonora individual (AASI). O IC ou “ouvido biônico” é um sistema constituído por componentes externo: processador de fala, microfone, antena transmissora e componente interno: um circuito receptor/estimulador, que é implantado cirurgicamente, juntamente com o feixe de eletrodos inserido na cóclea (órgão sensorial da audição). O implante coclear transforma energia sonora em um sinal elétrico, que estimula por meio do feixe de eletrodos inserido na cóclea diretamente o nervo auditivo ou VIII par craniano. Os sistemas de implante coclear são compostos por dois componentes. O processador de fala externo transforma a informação sonora em impulsos elétricos, que são enviados, por meio de radiofrequência modulada, através da antena para o componente interno, que está localizado abaixo da pele do usuário. Esse componente é formado pela bobina de recepção do sinal, receptor estimulador e um feixe de eletrodos, com diferentes contatos intracocleares para transmissão dos impulsos elétricos ao nervo auditivo.
O preparo dos candidatos ao IC envolve avaliações médicas, audiológicas e de imagem (tomografia computadorizada e ressonância nuclear magnética). A condição básica para uma aplicação bem-sucedida do sistema de implante coclear requer um nervo auditivo funcional, bem como vias auditivas centrais sem alterações. Além disso, uma cóclea anatomicamente desenvolvida deve estar presente para a inserção do feixe de eletrodos e a conexão com o nervo auditivo deve estar intacta. Cada paciente deve passar por um completo protocolo de avaliação audiológica antes do procedimento cirúrgico, bem como por acompanhamento após a cirurgia. Essa avaliação deve ser realizada através de uma série de testes audiológicos objetivos e subjetivos, que permitem determinar o progresso da reabilitação auditiva e os resultados do tratamento realizado.
Os critérios absolutos de indicação pelo Sistema Único de Saúde (SUS) e particulares para adultos pós-linguais são: resultado igual ou menor que 60% de reconhecimento de sentenças sem apoio da leitura orofacial com uso de AASI na melhor orelha ou menor do que 50% na orelha a ser implantada; adequação psicológica e motivação do indivíduo para o uso do implante coclear; condições adequadas de reabilitação na cidade ou região de origem. Apesar dos critério absolutos o sistema privado e de convênios atualmente também avalia a indicação em casos de perdas unilaterais profundas com zumbido associado. Já para crianças com perda auditiva pré linguais (antes da aquisição da fala) o processo de indicação segue o estabelecimento mais precoce o possível do diagnóstico audiológico. Posteriormente indica-se uso de AASI durante ao menos 3 meses com reabilitação auditiva eficaz para verificar alguma evolução na aquisição e desenvolvimento de linguagem antes da cirurgia de IC. Vale ressaltar que os programas de triagem auditiva neonatal (no primeiro mês de vida) e a avaliação precisa do diagnóstico auditivo infantil precoce (entre 3 e 6 meses de vida) são cruciais para a adequada evolução pós IC aproveitando assim o processo de plasticidade cerebral auditiva (maior capacidade de aprendizado e aquisição de linguagem) que é intenso até os 3 anos de vida.
Marcos Banhara
Fonoaudiólogo – Membro do Corpo Clínico NOOBA
CRFa: 4-13028