As alterações da fala e da linguagem são as perturbações do desenvolvimento
mais frequentes nas crianças em idade pré-escolar. Especificamente o atraso de
fala tem levado cada vez mais pais a procurarem especialistas em linguagem por
estímulo de redes sociais, blogs e afins. Esse excesso de informação auxilia no
diagnóstico e intervenção precoces, mas também traz medo, angustias e
preconceitos.
A comunicação não é restrita à fala, por isso mesmo os bebês têm capacidade de
se comunicar, seja por risadas, olhares, gestos ou sons da voz. A partir do
primeiro ano, já é comum que as crianças pronunciem as primeiras palavras,
que geralmente são tentativas de “mamãe” ou “papai”. O acompanhamento da
evolução da fala pelos pais é essencial para um diagnóstico correto. Anotar
palavras que as crianças falam pode ajudar o médico em uma avaliação mais
completa.
A partir dos dois anos, normalmente a criança forma as primeiras frases. Aos
três, orações mais completas e facilmente compreendidas por pessoas que não
convivam com a criança. Aos cinco, a fala já deve fluir sem dificuldade, porque
nesta idade o padrão de linguagem é semelhante ao de um adulto.
Nem todas as crianças têm o mesmo ritmo de desenvolvimento, mas, se houver
qualquer desconfiança de dificuldade na aquisição de linguagem, é
recomendável buscar ajuda de especialistas. Uma intervenção considerada
precoce, feita antes dos três anos, com terapia fonoaudiológica e
acompanhamento médico – otorrinolaringologista e neuropediatra – pode
oferecer resultados mais rápidos.
Existe a crença de que tudo bem se a criança não falar antes dos três anos, de
que vale a pena esperar. Essa crença é perigosa e pode ter consequências graves
no desenvolvimento infantil. Até os quatro anos, a criança tem uma “janela de
linguagem intensa.” Mas ela é muito intensa entre 0 e 24 meses – quando os
neurônios crescem e formam conexões, por isso, esse é o melhor período para
atuação visto a intensa capacidade desses neurônios organizarem-se. A partir
dos quatro anos, a resposta será mais lenta e o prognóstico piora a cada ano que
passa sem intervenção.
A comunicação não-verbal das crianças também deve ser notada. Mesmo sem
falar, é preciso avaliar se a criança se comunica. Ele aponta o dedo, faz mímica,
há expressão de emoção? O conceito de linguagem é amplo, nós somos capazes
de nos comunicar de várias formas com gestos e emoção. A fala é uma forma de
linguagem – nesse caso, oral. Casos de atraso de desenvolvimento da fala
exigem uma atuação conjunta entre médicos e fonoaudiólogos. Antes de iniciar
uma intervenção, é preciso descartar problemas genéticos, psiquiátricos e
auditivos por meio de exames clínicos.
Eletrônicos prejudicam o desenvolvimento de fala e linguagem?
Um dos vilões da aquisição de linguagem é a variedade de equipamentos
eletrônicos que existe hoje. O contato cada vez mais cedo com televisão, tablets
e smartphones pode ser prejudicial para a criança. O ideal é a criança não ter
contato com nada disso antes de dois anos, e depois ter um acesso limitado
(recomendação da Organização Mundial de Saúde). Existe, sim, influência
porque a tela afeta o desenvolvimento sensorial da criança, e ele é importante
para o desenvolvimento da linguagem. A tela distrai a criança e dificulta que
aprenda ou se desenvolva durante o contato com os equipamentos.
Aos pais: as horas que passam com filhos precisam ser de interação, conversa,
brincadeira, leitura de histórias e qualquer atividade que tenha a conversa por
intermédio são aproveitadas. As crianças começam a falar por imitação.
Nenhum eletrônico substitui o contato físico presencial nesse aspecto.
Atraso de fala é diagnóstico de autismo?
Não. O atraso na fala pode ser um dos sintomas de comprometimento
neurológico ou de transtornos como o autismo, porém isoladamente não é
critério diagnóstico. Mesmo nesses casos, com intervenção precoce e
especializada é possível ter chances de sucesso, ou seja, as crianças no espectro
autista virem a desenvolver fala. São raras as crianças não verbais – casos muito
severos.
Antigamente o diagnóstico de autismo era focado na linguagem falada. Agora já
há a percepção da linguagem não falada, como o olho no olho e a observação da
atenção da criança. Hoje os professores e profissionais que lidam diariamente
com criança percebem mais a comunicação não-verbal, mas grande parte dos
médicos ainda não têm esse preparo acurado.
Existe uma série de outras patologias que podem ser relacionadas ao atraso de
fala. É mais provável ser uma alteração de linguagem do que ser autismo. Esse
susto – da possibilidade de um diagnóstico como autismo – mobiliza alguns pais,
mas para outros dificulta a busca pela ajuda por medo.
Dr. Fábio Alencar
Otorrinolaringologista – Membro do Corpo Clínico NOOBA
Otologista pela Universidade de São Paulo – USP
CRM-BA: 39.762 | RQE: 22.238